Agenor Gasparetto* e Álvaro Ferreira**
Ao final dos processos eleitorais em que participamos realizando pesquisas, temos feito reflexões, além da prestação de contas. O objetivo é contribuir para a compreensão da realidade em razão de fatos ocorridos.
Da Justiça Eleitoral e da pesquisa
A Justiça Eleitoral representa um avanço importante na democracia do país. Regras claras são necessárias. Também representa um avanço a regulamentação da publicação de pesquisas eleitorais. No entanto, creio que seja possível aprimorar essa legislação, no sentido de priorizar o interesse da sociedade. No final desta exposição, vamos fazer uma sugestão que, acreditamos, poderá produzir efeitos positivos na perspectiva da sociedade e da própria atividade de pesquisa, para além das formalidades e tecnicalidades burocráticas.
Do Plano Amostral e da indústria da pesquisa
A exigência legal do Plano Amostral, assinado única e exclusivamente por um Estatístico, pela força da corporação dos Estatísticos, está dinamizando a indústria da pesquisa, incluindo os estatísticos, os advogados e os institutos.
É raro uma pesquisa registrada não ser objeto de tentativa de impugnação. Não por razões técnicas, mas por razões políticas e de marketing. Isto porque toda pesquisa registrada, exceto as realizadas regularmente e veiculadas pela grande mídia, atendem a objetivos de marketings de campanha e o os que se sentem atingidos reagem, e a tentativa de impugnação é um das alternativas. No limite, pressupõem que a mera existência do processo de impugnação, de alguma forma, cumpre uma função, a de colocar em dúvida a confiabilidade da pesquisa divulgada. Não são propriamente um serviço de informação à sociedade. São parte de uma estratégia de tentar persuadir o eleitor.
Os fundamentos desse pressuposto podem ser frágeis empiricamente, mas há a crença férrea, por parte dos candidatos e de seus assessores próximos, de que a divulgação influi na decisão do eleitor. Equivocadamente, acredita-se na pesquisa divulgada como formadora de realidade nova e não como reflexo e, nesse caso, não passando de uma confirmação de uma realidade intuitivamente já sabida pelo eleitor. E a divulgação, nesse caso, apenas teria o mérito de confirmá-la. Todavia, essa é uma outra discussão que merece análise, a da real influência das pesquisas divulgadas.
Divulgação como direito à informação e como estratégia de marketing
A divulgação de pesquisas tem como pano de fundo o direito à informação. A sociedade tem o direito de ser informada. Esse parece que deva ser o princípio que funda a possibilidade de divulgação de uma pesquisa. Por essa razão, parece-nos que se constitui uma necessidade restringir sua instrumentalização pelo marketing.
Aqui é necessário fazer algumas distinções:
Na perspectiva da finalidade da realização de uma pesquisa, registradas ou não, emergem quatro principais:
Informação à sociedade, jornalismo propriamente dito. Realização dos grandes meios de comunicação e seguindo um calendário pré-estabelecido.]
Subsídios ao planejamento e a estratégia de campanha. Interessa aos partidos e aos candidatos.
Marketing, sendo a pesquisa instrumentalizada para os objetivos de uma estratégia.
Ancorar investimentos (e, o que cresceu muito e em todos os quadrantes do estado da Bahia, para realização de apostas a dinheiro).
Exceto as pesquisas regulares e que seguem um calendário de divulgação, cumprindo uma função jornalística, as demais não são propriamente a realização do direito à informação. Nesses casos, a informação só é divulgada porque convém a algum grupo político, que imagina estar se beneficiando por essa divulgação. Essa mesma pesquisa, caso tivesse resultados ruins, não seria divulgada. A Lei permite isso. Está dentro da regra do jogo.
Realidade diferente seria, como se disse acima, a divulgação de pesquisas obedecendo um calendário de realização e de divulgação. Um veículo de comunicação que desejasse servir verdadeiramente a sociedade, cumprindo função jornalística, pode fazer com meses de antecedência um calendário de divulgação e o cumpriria. Sendo assim, a Justiça Eleitoral e a sociedade saberiam desse calendário e qual empresa de pesquisa as realizaria. Quando isso acontecer, estaremos diante de uma situação em que a informação está acima e além dos interesses do marketing de alguma candidatura. No geral, nas pesquisas registradas, não é essa a perspectiva. Na Bahia, nesta campanha, por exemplo, o jornal A Tarde realizou essa prestação de serviço de informação à sociedade, contratando e divulgando pesquisas.
A vitória do formalismo no registro de pesquisas eleitorais
Hoje, a Justiça Eleitoral, ao exigir Plano Amostral, privilegia o formalismo. Frisamos que o rigor da Lei está incidindo sobre aspectos formais, de muito difícil avaliação pelas partes interessadas, como se detalhará adiante.
No entanto, o fundamental continua sendo o resultado da pesquisa em comparação com o que as urnas revelam. E nisso, não vemos mecanismos por parte da Justiça Eleitoral. Parece não haver essa preocupação. Esse é um detalhe essencial e que faz toda a diferença, em vários sentidos.
Este é um ponto que imaginamos se deva buscar mecanismos para que as pesquisas sejam efetivamente avaliadas não apenas no seu plano formal, o do Plano Amostral, mas também no plano real e no plano dos resultados alcançados sempre e necessariamente tendo como parâmetro, às urnas.
As partes interessadas poderiam ter, além dos elementos do plano amostral, já exigidos, também os resultados da pesquisa propriamente dita. Estranho que todo esforço do legislador se situe não no plano da realidade, mas no plano do formalismo. O Plano Amostral incide unicamente sobre dados estatísticos secundários, não da pesquisa realizada.
Enfatiza-se que a única referência que pode efetivamente atestar a qualidade de uma pesquisa eleitoral é a confrontação pesquisa versus urnas. Esse é o teste de qualidade e que a Justiça Eleitoral não está buscando e quando busca, como se pode ver nas petições que visam impedir sua divulgação, é no sentido de mais burocracia e mais formalismo, como no caso de uma assinatura virtual do Estatístico, por exemplo. E, no sistema do TSE, para atender essa possível nova demanda, terá que se encontrar um espaço em que além do nome e no número de registro do Estatístico do Conselho Regional, também haja a assinatura do mesmo. Ou seja, mais formalismo e mais burocracia, em vez se focar o que realmente faz a diferença, mas não entra no radar das atenções do legislador.
Pesquisas de Boca de Urna e pesquisas anteriores ao dia das eleições
Cremos que os grandes veículos e os grandes institutos são, talvez, os únicos que publicam regularmente pesquisas. Imaginamos que haja um calendário de pesquisas atrelado ao calendário eleitoral. Explicitar esse calendário deveria ser uma obrigação de todos quantos queiram realizar e divulgar pesquisas. Faria bem à democracia e à própria sociedade.
No entanto, os grandes institutos comparam seu desempenho não com a última pesquisa realizada antes do dia da eleição, mas com a pesquisa boca de urna, após o voto ser dado na cabine, realizadas com amostras geralmente maiores do que as normalmente feitas. Caso seu desempenho fosse comparado com o resultado da última pesquisa realizada antes do dia da eleição, seria possível ver com mais clareza a fragilidade das pesquisas e o quanto podem estar mistificadas e, por tabela, ver o real alcance de uma divulgação. Faria bem à democracia perceber que as pesquisas não podem ter a pretensão de substituir as urnas. Seria bom os eleitores perceberem essa fragilidade e não seria ruim para a pesquisa uma dose de humildade. Nãos somos infalíveis, ainda que queiramos acertar.
As pesquisas são um poderoso instrumento, mas podem ser frágeis. Ter clareza dessa fragilidade, portanto, diminuiria o peso da pesquisa e de sua divulgação e haveria menos ilusões, porque os eleitores teriam consciência de que esse poderoso instrumento tem limites, por mais necessário e poderoso que seja enquanto ferramenta e subsídio ao planejamento e a estratégia de uma campanha.
Frisamos, as pesquisas são mais frágeis do que os institutos queremos fazer crer. E isto não é ruim nem para os institutos, que passam a ser menos pressionados quando os resultados não são os que o cliente espera, e é bom para a democracia e para a sociedade. O eleitor precisa entender que toda pesquisa tem prazo de validade. Uma fotografia realizada a uma, a duas semanas ou mesmo a um ou dois meses antes não pode pretender que encontre na urna o que essa fotografia encontrou. Há um prazo de validade. Ter consciência disso relativiza o poder e a influência de uma eventual divulgação de resultados.
Teoria e prática da pesquisa
Na prática de campo, tudo fica mais complexo do que supõe a teoria, dado que as pessoas não ficam em casa, no bairro em que moram, mas vão para os seus afazeres, e a pesquisa, pelo menos a residencial, pressupõe que eles, os eleitores, serão encontradas em suas casas e em seus bairros, pois a amostra, quase sempre, irá às casas para cumprir a cota de um bairro ou região e muitas pessoas, pressupostas pela pesquisa, simplesmente não mais estarão lá quando o pesquisador passar lá. Há, pois, um descompasso entre a realidade do plano amostral e a realidade de campo.
Teoricamente, a pesquisa deveria dar a todos a possibilidade de serem amostrados. Como a maioria não está presente em suas casas por ocasião da pesquisa, a cota acaba sendo preenchida por aqueles que, por alguma razão, lá estão. E esse fato pode se constituir em um problema.
A ditadura do senso comum
Em Itabuna, nesta eleição, na pesquisa registrada pelo Instituto (e confirmada nas urnas), foram ajuizadas duas impugnações, alegando estar, como toda pesquisa registrada, na perspectiva da referida indústria, no jargão dos advogados, “eivada de irregularidades, ilegalidades”, quando não serem simplesmente “fraudulentas”. Por acaso, uma das alegações de ambas as tentativas, teve como base a não inclusão na amostra a zona rural de Itabuna, representada por duas comunidades: Mutuns e Itamaracá. Viu-se nesse episódio um vício e mais um elemento a comprovar que a pesquisa estaria “eivada de irregularidades”. Ocorre, porém, que esses dois povoados, juntos, somam 0,49% dos eleitores do município. Como o ponto de corte foi meio ponto, não foram amostrados. Técnica e estatisticamente, nenhum problema. Mesmo assim, essa vem sendo a argumentação para tentativas de impugnação, como se disse, de cunho político, e não técnico.
A propósito, por esse critério, nenhuma pesquisa nacional poderia ser publicada, dado que essas pesquisas são realizadas entre 144 e 200 cidades em um país que tem mais de 5600 municípios e nenhuma na zona rural, ou seja, cerca de 97% dos municípios não são amostrados e há, no tocante ao rural, seguramente próximo de 20% de eleitores ainda vivendo na zona rural neste país. Não fazer pequenos povoados e na zona rural pode parecer um erro, mas, tecnicamente, é um erro maior apostar neles e não nos centros mais dinâmicos e fazedores de opinião. Para cargos majoritários, o que vale para o país, vale para Itabuna e para qualquer município. Nesse particular, não há problema de ordem técnica não se incluir numa amostra um povoado rural. Contudo, nas tentativas de impugnação, de natureza política, há parágrafos e até páginas escritas tentando embasar esse problema ou “vício” da pesquisa.
Em nossa opinião, o Direito Eleitoral não pode fazer a pesquisa se curvar ao senso comum, com suas exigências e seus conceitos aquém da ciência e da técnica. É preciso assegurar a liberdade metodológica.
A perspectiva do senso comum tolhe a liberdade metodológica da pesquisa. Induz a um reducionismo metodológico. Fortalece a dimensão tecnicista ou mesmo prática ao invés de uma abordagem na perspectiva das Ciências Sociais e/ou da Sociologia e Política como as pesquisas o são em sua natureza.
A propósito, com o avanço do Bigdata, em que em vez de pequenas amostras, se consiga captar a opinião, graças ao uso da Internet da totalidade de seus usuários e em tempo real, como ficarão as atuais exigências legais do Plano Amostral, por exemplo?
Hoje, numa pesquisa pensada exclusivamente para realização no fluxo, como as do Datafolha, e não residencial, o Plano Amostral não pode ser atendido.
No futuro, com o avanço das novas tecnologias ligadas ao Bigdata, toda a legislação atual passará por atualização ou ficará simplesmente obsoleta.
Fato estatístico e fato sociológico
Enquanto categoria profissional, os estatísticos são mais organizados que os sociólogos ou cientistas políticos e outras categorias profissionais ligadas ao mundo da política. No caso da pesquisa eleitoral, conseguiram, pela força da corporação, colocar na Lei Eleitoral a exigência de que toda pesquisa tenha assinatura de um profissional da categoria e esse deve estar devidamente inscrito no seu Conselho Regional.
No entanto, a Estatística é apenas uma ferramenta a serviço da pesquisa. Responde pela amostragem e poderá colaborar no Plano Amostral.
Observamos que em praticamente todos os cursos de nível superior que tem a disciplina de Estatística, a amostragem é ensinada. Mesmo assim, mesmo que um profissional tenha feito muitas disciplinas de Estatística, domine plenamente essa técnica, não poderá assinar. Mais grave: caso o professor que forma o Estatístico nos cursos de graduação, tenha mestrado, doutorado e pós-doutorado na área, mas não seja associado ao conselho da categoria, não poderá assinar. Ou seja, não se trata de uma exigência técnica, mas de uma exigência corporativa. Só pode assinar quem estiver inscrito no Conselho, em dia com a contabilidade, assim como o Instituto deverá ter as anuidades em dia. Outros profissionais, estão a priori impedidos de responder tecnicamente pela pesquisa.
No entanto, uma pesquisa eleitoral é mais que qualquer técnica necessária a sua realização, de natureza estatística ou não. Uma pesquisa caso falhe no campo, na questão da abordagem, será um fracasso. O todo da pesquisa não pode ser reduzido a uma de suas dimensões técnicas. A exigência da assinatura única e exclusiva de um profissional sindicalizado, se trata de uma exigência em que uma parte responde por um todo que a ultrapassa, infinitamente.
Por analogia, um dos campos da ciência que mais realiza pesquisas e mais faz uso dessa ferramenta, é a área médica. Essa área faz uso sistemático e aprofundado de técnicas estatísticas.
Uma pergunta, quem assina o diagnóstico da enfermidade e/ou seu tratamento é um Estatístico ou um médico? No caso da pesquisa médica, há o entendimento de que o todo é mais do que a técnica.
Já no caso da pesquisa eleitoral, sendo a pesquisa em seu todo um fenômeno sociológico ou político, se dá um reducionismo técnico incompreensível e que, em nossa opinião, o legislador precisa reavaliar.
Reforçamos, a pesquisa eleitoral é uma realidade sociológica ou sócio-política em que conhecimentos e técnicas estatísticas são necessários. Esse é o todo. Nesse todo, cabe a participação do conhecimento estatístico, mas também do sociológico, do geográfico, do político e o da psicologia social. Sobretudo desses campos de conhecimento. A pesquisa eleitoral é muito mais do que aplicação de uma técnica estatística. Esse reducionismo prejudica a pesquisa.
A revisão desse ponto não reduzirá o mercado de trabalho do Estatístico e fará justiça à realidade.
O legislador, insistimos, deveria olhar para esse detalhe relevante: uma parte não pode ser maior do que o todo. O que vale na área médica e todas as áreas científicas que fazem uso das ferramentas estatísticas também deveria valer para o campo da pesquisa eleitoral.
Sobre o Plano Amostral
O Plano Amostral para ser elaborado precisa dos dados do próprio TSE, (eleitores por gênero, faixas de idade e área de realização da pesquisa) e do IBGE, no caso, dados do Censo de 2010 (renda familiar, escolaridade e nível econômico). Esse é o plano. Há também o plano realizado e esse, como já assinalamos, não está no sistema registrado para comparação como se verá adiante.
No caso da área física de realização da pesquisa, os dados são atuais. Contudo, há um problema prático. Sua localização se situa onde há seções eleitorais. Caso um bairro de uma cidade não tenha uma seção, não estará representado numa eventual amostra com base nos dados literalmente oriundos do TSE. Esses dados são muito precisos no tocante à área rural, com seus distritos e povoados. Contudo, na área urbana, são um problema prático. Haverá bairros que não terão seções e outros que acolherão eleitores de vários bairros.
Isto supondo que o cadastro dos eleitores nas seções de uma cidade reflita a residência dos eleitores. O que evidências empíricas mostram é que há problemas aqui. Essa correspondência entre morar e seção eleitoral não acontece necessariamente.
Mesmo assim, dado o constrangimento gerado pelas tentativas de impugnação da indústria da pesquisa, somos obrigados a fazer algum tipo de ajuste para a amostragem respeitar as seções eleitorais. Ou, como se poderá ver em muitas pesquisas registradas, simplesmente arrolar o nome de dezenas de bairros da cidade sem apresentar a cota de cada um, ou simplesmente arrolar os setores do IBGE. E caberá ao juiz decidir se aceita ou não essa área física de realização da pesquisa.
Acreditamos que melhor seria deixar que cada instituto adote a metodologia e a amostragem que entenda captar melhor a realidade e que responda pelos resultados. Mais adiante se verá como seria isto possível.
Pesquisas de todo tipo e sua saturação
Nesta eleição, na fase final da campanha, vimos a multiplicação das pesquisas e de seus realizadores, institutos ou mesmo profissionais ou práticos de todas as formações acadêmicas ou sem formação superior interessados em captar fatia desse mercado. Na fase final da campanha, raro foi estar em um município sem estar na companhia de outras pesquisas sendo realizadas. Virou uma indústria. Os eleitores, com razão, passaram a se recusar a dar mais entrevistas. Pesquisas a toda hora e de todo tipo. Pesquisadores sem crachá de identificação, formulado algumas poucas perguntas, ou querendo anotar dados do entrevistado, como se fosse um cadastro.
Na prática, há uma banalização da pesquisa, o que levou a saturação e, com isso, a um prejuízo na captação da realidade, pela recusa crescente em conceder entrevistas por parte de eleitores.
Para além do Plano Amostral: Sugestão para aprimorar
No início desta exposição e em vários momentos, afirmamos que se faria uma sugestão que poderia produzir efeitos positivos na perspectiva da sociedade e da própria atividade de pesquisa. Em nossa opinião, também seria salutar a todos os profissionais, incluindo os Estatísticos, hoje protegidos pela Lei, ainda que de forma discutível.
A Legislação Eleitoral no tocante à pesquisa está sendo atropelada pela realidade das novas mídias. Pesquisas não registradas circulam livremente nas redes. Não há condições de dispor de aparatos policiais para controlar simultaneamente pesquisas sendo realizadas e divulgadas, reais ou meras peças de ficção, nesses mais de 5600 municípios desse país, simultaneamente. Na prática, como eleitores, recebemos com frequência resultados eleitorais de procedência duvidosa, mas circulando e objetivando semear a dúvida nos vários grupos de whats app e outros aplicativos. A exigência legal da divulgação só de pesquisas registradas está sendo atropelada, por pesquisas reais e por literalmente pesquisas fakes, ao sabor das conveniências. E, com a evolução do Bigdata, em breve todo esse aparato estará anacrônico e implodido.
Qual solução? Não há solução fácil. Seguramente, mais burocracia e mais formalismo não irão contribuir. Antes, pelo contrário.
No caso das pesquisas registradas, além do Plano Amostral, e sua “camisa de força” que constrange a liberdade metodológica e tenta subordinar a pesquisa a ditadura do senso comum, há um item que fará diferença e tem o potencial de efetivamente aprimorar o instituto da pesquisa no curso do tempo.
Esse item é exigir legalmente a que toda pesquisa registrada, além do Plano Amostral teórico, tenha seu relatório composto também pelo seu Plano Amostral realizado e os resultados eleitorais propriamente ditos, exposto de forma permanente no sistema do TSE e que possam ser comparados com o resultado das urnas.
Essa memória registrada e acessível fará o crivo necessário à qualidade das pesquisas e de seus institutos. A sua existência criará as bases para a necessária depuração da boa e da má pesquisa. E o curso do tempo a consolidará.
Será salutar para a pesquisa saber que os resultados serão públicos e disponíveis de forma permanente a quem tenha interesse em analisá-los e compará-los com o que efetivamente pode comprovar sua qualidade: as urnas.
Hoje, dado que no sistema não consta nenhum dado da pesquisa realizada, mas apenas os do Plano Amostral, prévio à pesquisa e apenas com dados do IBGE (defasados em 10 anos) e do próprio TSE (condicionados no plano físico a localização de seções eleitorais), o cidadão não tem condições de aferir a qualidade da pesquisa registrada.
Sublinha-se: o teste real da pesquisa é a urna.
Observe-se que por não haver essa inclusão técnica dos resultados de pesquisa no sistema do TSE não há responsabilização por equívocos. Não há como se aferir sua qualidade.
Excetuando as pesquisas regulares dos grandes veículos, a divulgação que é feita, não é técnica, mas peça de marketing, pois precisa cumprir uma função mercadológica, para a qual é contratada.
Quando a legislação exigir que o relatório técnico esteja exposto e de forma permanente no sistema, a qualidade da pesquisa irá melhorar, o papel e o poder das pesquisas será melhor compreendido.
Essa medida irá qualificar a instituição pesquisa. E poderá ser dada liberdade plena aos institutos no tocante à metodologia utilizada para captar a realidade. Formalismos e burocracia perderão importância. As urnas irão separar o joio do trigo, a boa prática e a prática fraudulenta. E o tempo fará a necessária depuração.
A memória da pesquisa registrada precisa estar ao alcance de todos e de forma permanente.
Proposta
O Instituto de pesquisa deve anexar no sistema, após o quinto dia de espera para avaliação, um relatório contendo o plano amostral realizado (o Plano Amostral teórico já estará desde o registro) e os resultados eleitorais propriamente ditos, de forma técnica, e esse relatório deve ser de acesso livre antes e depois da eleição.
Isto não impedirá que as campanhas que contratam uma pesquisa, dela façam suas peças de marketing como é praxe, mas dará transparência. E essa transparência fará bem à sociedade, à democracia e à própria pesquisa.
Enquanto não se fizer o essencial e que faz a diferença, permitir que as partes interessadas e a sociedade em geral possam aferir e comparar pesquisa e urnas, se continuará a criar mais formalismo e mais burocracia na ilusão de que isso resolverá.
Itabuna, 30 de novembro de 2020.
Agenor Gasparetto* e Álvaro Ferreira**
*Sociólogo, instituto GPE Bahia/Sócio Estatística
** Advogado, Álvaro Ferreira Advogados Associados.
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